Exclusivo: Rjpost conhece acampamento bolsonarista em frente ao CML e acompanha rotina dos manifestantes
Roberto Márcio
“Nossa esperança não acabou. O Brasil não pode ser presidido por um ladrão, apoiado por um bando de bandidos do STF. Todo mundo sabe que essa eleição presidencial foi uma fraude, o Bolsonaro [Jair Bolsonaro, candidato à reeleição] foi descaradamente roubado e não vamos aceitar isso”, disparou a aposentada M. A. D, de 58 anos, que é uma das centenas que estão há 48 dias acampados em frente ao quartel do Comando Militar do Leste, no Centro do Rio.
A revolta de M.A.D é compartilhada por centenas de pessoas que resolveram abrir mão de seu cotidiano com a família, trabalho e tudo mais para protestar contra a vitória de Luís Inácio Lula da Silva, confirmada em segundo turno no mês de novembro. Mas afinal, o que leva essas pessoas a abrirem mão ou dividir seu tempo em nome de uma causa que, para o Superior Tribunal Federal, seria uma “causa perdida”? O Rjpost foi conferir a rotina desse acampamento, como é a rotina das pessoas e desnuda os pré-conceitos sobre aqueles que são acusados de serem manifestantes antidemocráticos.
Antes de tudo, o Rjpost aceitou as condições da cúpula dirigente de um dos acampamentos de manifestantes em frente ao CML, em que iremos omitir nomes dos entrevistados porque teme-se que reportagens como essa possam levar a justiça federal prender estas pessoas por conta de suas expressões e modo de pensamento. E a reportagem viu de perto o esforço militante pela causa em que acreditam ser a verdadeira. E uma das coisas que mais chamou a atenção é que seriam um aglomerado de gente, cheias de ódio e que querem transformar o país em uma ditadura militar. Na realidade, existe mesmo é um amor à sua causa, livre expressão de pensamento e muitos bate papos sobre a realidade política no Brasil.
No chamado acampamento 1, em que o Rjpost permaneceu, é terminantemente proibido defender esse ou aquele político. O único nome que pode ser abordado é o de Jair Bolsonaro, Presidente da República até o dia 31 de dezembro. No entanto, se depender da vontade dos manifestantes, que não querem que Lula suba a rampa do Palácio do Planalto na posse que vai acontecer no início de janeiro, esta pessoa é mal quista. ” Esse ladrão [se referindo a Lula] não pode comandar o país. Vamos virar uma Cuba, Venezuela ou Nicarágua. É inadmissível que o Brasil passe por esse momento tão cruel. Estamos unidos contra essa bandidagem do PT”, contou o ex-militar R.O.S., um dos muitos patriotas desejosos na permanência de Bolsonaro na presidência.
Disparar contra países de orientação esquerdista é um mantra que se ouve muito dentro do acampamento. As mazelas econômicas que consideram fracassadas dentro do contexto mundial hoje, são apontadas como perigosas e que o Brasil não deve seguir de forma alguma. E sempre se discute entre as pessoas saídas para que o país se mantenha no curso liberal economicamente e com proteção às empresas nacionais. Por outro lado, essa incrível mobilização que tem atraído cada vez mais pessoas só deve terminar, de acordo com os acampados, quando Bolsonaro ser confirmado presidente para os próximos quatro anos.
Rotina diária: alimentação, saúde e sobretudo não responder às provocações
Os manifestantes que estão no acampamento há mais de um mês não são pessoas indolentes, insensíveis e que querem defender os mais ricos. Pelo contrário. O Rjpost testemunhou, por várias vezes, pessoas pobres sendo auxiliadas com comidas, água e remédios. Aliás, vale lembrar, ali próximo está a comunidade do Morro da Providencia, uma das áreas mais carentes do Rio de Janeiro. “Muitos falam que discriminados e que queremos ver longe os pobres. Nada mais mentirosa possa ser essa afirmação. Ajudamos a todos que nos pedem qualquer tipo de colaboração”, explicou um dos colaboradores do acampamento, T.G.C.
O Rjpost testemunhou, também, que dar aos militantes em frente ao CML como violentos, é apenas um rótulo que não corresponde à realidade. Era comum alguns populares gritarem o nome de Lula próximo ao acampamento, mas os manifestantes ignoram tais provocações. “Isso aí a gente está acostumado. Não vamos reagir a isso, porque é exatamente o que esses esquerdistas querem. Não vamos dar motivos para nos prejudicarem. Somos pacíficos, vamos defender nossas convicções. Houve até um carro que parou próximo a nós e um sujeito, armado, tentou nos intimidar. Mas acima de tudo, temos Deus conosco”, contou G.O.P, de 47 anos.
Dentro do acampamento existe um rancho, onde voluntárias fazem a comida dos acampados, um posto de enfermagem onde colaboradores que incluem médicos, enfermeiros e até um fisioterapeuta se revezam para atender ás pessoas. O repórter do Rjpost se ofereceu para trabalhar voluntariamente como psicólogo no local e o que pude constatar é que esses muitos dias de ativismo trazem alguns problemas de saúde, como ansiedade (gerada sobretudo pelos noticiários políticos), gripes, pressão alta e dores de cabeça. Um ponto bem interessante é que os profissionais da saúde são muito engajados com todos que procuram o postinho. Como profissional da saúde mental, a expectativa por dias melhores no mundo político é o que alimenta o sonho daquelas pessoas que acreditam numa virada eleitoral.
Todos ali fazem por cada um que decidiu abrir mão de parte de sua vida para se dedicar a uma causa. E mesmo à noite, quando a maioria das pessoas se recolhem, para dormir, voluntários se revezam para vigiar o acampamento, a fim de evitar que sejam atacados por facções políticas rivais ou até mesmo por bandidos. O Rjpost conversou com um dos seguranças, um policial civil aposentado, de 60 anos, que explicou a importância de seu papel na proteção dos indivíduos. “Existem muitas pessoas ruins nesse mundo. Temos que estar preparados para proteger as vidas que aqui estão, mesmo em frente ao Comando Militar do Leste”, falou, com poucas palavras esse ex-agenda do estado. Através de rádios, eles se comunicam sobre qualquer atitude suspeita que ameace o acampamento.
No geral, outro estigma dos chamados pelo STF de “manifestantes antidemocráticos” de que são pessoas preconceituosas, também não corresponde à aquela realidade. Há pessoas de diferentes gêneros que estão lá, são respeitadas e tratadas com equidade. “Todos aqui são brasileiros, patriotas e independente de sua crença, cor ou preferência sexual, estará aqui conosco”, afirma V.O.A,, que não se disse heterossexual e não tem qualquer tratamento diferenciado ou discriminação. “Aqui somos todos brasileiros, temos índios, negros e tudo mais. Aqui somos uma família da direita brasileira”, completou.
Mas afinal, qual a conclusão do Rjpost sobre essa imersão no mundo bolsonarista? Não são pessoas desvairadas, ignorantes e que querem a todo custo impor uma agenda antidemocrática que venha a exterminar com os pobres. São pessoas comuns que exigem maior clareza sobre o processo eleitoral que culminou na vitória do petista, que outrora fora preso acusado por corrupção, que Bolsonaro continue como presidente do Brasil, com maior participação das forças de segurança atuando com rigor contra todos os tipos de crimes. A sociedade, no geral, precisa compreender que diferentes pensamentos também fazem parte da democracia de qualquer país, e que o movimento da direita se fortaleceu nesses últimos quatro anos e, que pelo visto, pretendem ficar para valer, participar de todas as discussões que envolvam o nome do Brasil.